Saí de cena

Quero que o tempo acabe de vez com este espetáculo. Acabou. Saí de cena porque me cansei das histórias dos que comigo atuavam e do burburim do público. Dos sorrisos frontais e das críticas pelas costas. Cansei-me da hipocrisia e dos mal entendidos. Fechei o pano, acabou a peça.

Dizem que “a sabedoria consiste em ordenar bem a nossa própria alma”. Fazer e desfazer. Escrever e riscar. Planear e desanimar. Rir e chorar. Viver e… reviver. Cair sete vezes e levantar-se oito. Sem pressas. Sem aspas nem reticências. Sem vírgulas. Sem nada mas com tudo. Toda a essência. Toda a alma e todo o ser.

Saí de cena, saí para respirar. Vou correr, fugir dos palcos. Vou para longe, o mais possível. Saí de cena para entrar na máquina do tempo. Todos temos as nossas. As que nos levam ao passado chamam-se memórias. As outras, aquelas que nos levam para a frente, chamam-se sonhos. Vou entrar na segunda.

Saí de cena. E saí em silêncio porque é aí que começa a sabedoria. No silêncio. Em silêncio…

Patrícia Silva – 26|07|2015

Metamorfose

metamorfose

“Não haverá borboletas se a vida não passar por longas e silenciosas metamorfoses.”

Estou a passar por uma. Longa, certamente. Silenciosa, nem tanto. Perco a calma e nesta minha alma vai uma gritaria do caraças.

Bem sei que estas metamorfoses são necessárias. Libertam-nos. Elevam-nos a um novo patamar de auto-conhecimento. Levam-nos ao desapego. Dão-nos asas e enchem-nos a vida de cor. Amadurecem-nos.

Das duas uma: ou esta é a primeira pela qual estou a passar ou então não aprendi nadinha com as anteriores. Caio e volto a cair, inevitavelmente, nos mesmos erros do passado. Carrego comigo um grande defeito: o apego. E, sinceramente, acho que nem com mil e uma metamorfoses hei-de perder esta minha mania.

O desapego devia ser excluído do dicionário. Do dicionário e dos corações mais vulneráveis, como o meu. Odeio despedidas. Caramba, sou mulher! Mais do que isso, sou mulher lamechas, chorona e saudosista. Odeio saudades e finais. Seja do que for… nenhum final é feliz (vá, pelo menos não é suposto ser, se é final é fim, por isso, é triste).

E, se não for o desapego, que seja o apego a ser excluído do dicionário e dos corações. Se calhar ainda era melhor e simplificava-me bastante a vida. Agarro-me demasiado a tudo e a todos. Dou-me em excesso e sofro em silêncio pelo pouco que me dão. Não dou para receber, não. Até porque, na verdade, sinto-me bem melhor a dar do que a receber. Mas, caramba, sou mulher! (Não, isto não são as hormonas da TPM aos saltos.) E sou exigente e teimosa. Apaixonada e sentimental. E custa. Aliás, dói para caraças estar totalmente consciente deste meu defeito (feitio) mas, mesmo assim, cair que nem uma patinha em tudo o que me dizem.

Bem sei que estas metamorfoses são necessárias. Temo é que o raio da minha borboleta nunca esteja preparada para sair do casulo. O raio da moça vai-me dar que fazer…

Patrícia Silva – 23|07|2015

De viagem.

Viajar

Quanto pesa a felicidade? Quanto pesam um sorriso e uma lágrima? Quantas gramas pesa a minha alegria? E os meus medos e remorsos? E os sonhos que comigo carrego, quanto pesam? Tenho a balança estragada e alguém me disse que não tem conserto. Às vezes a vida traz-nos estas surpresas. Leva-nos os GPS’s para nos obrigar a basculhar no mapa. Arranca todos os sinais de trânsito e as placas de indicação para irmos ao encontro de alguém, para nos mexermos, para sairmos da nossa zona de conforto. Força-nos a sair da caixa que nos prende o corpo e sufoca a alma.

Estou de viagem. De viagem ao mundo encantado do desconhecido. Um mundo que mais ninguém vê. Um mundo de pontes, em vez de muros. De boas palavras, em vez de insultos. De perguntas, em vez de opiniões alheias. Um mundo onde todos falam no discurso direto. Gosto do discurso direto. Frente a frente, cara a cara. O indireto faz-me comichão. Traz demasiados mal entendidos, demasiadas correntes estragadas e, pior, demasiadas mentiras.

Estou de viagem. Fui obrigada a viajar porque me levaram o GPS e todos os sinais que, um dia, segui. Arranquei a capa de mim mesma. Nunca me senti tão perdida e tão perto da solidão. Mas a noite ensinou-me a viajar. Sei que, no fim, tudo correrá bem. Se assim não for é porque ainda não chegou ao fim.

Fiz as malas. Lembrei-me tantas vezes de tudo o que julgava esquecido. Mas estou de viagem. Agora, é hora das dores virarem sorrisos. E as dores e os sorrisos, quanto pesam?

Estou de viagem. Tenho a balança estragada e alguém me disse que não tem conserto. Não tem conserto o tanas! A morte não tem conserto… tudo o resto, remediado está (ou estará) um dia!

Viajar

“Vem-te perder comigo até a gente se encontrar”

Patrícia Silva – 22|07|2015

Nos teus passos

Nos teus passos

Sigo-te. E não posso, não quero nem devo. Sigo-te com a teimosia das palavras que insistem em não sair e com a persistência destas mãos que me obrigam a escrever. Sigo-te como os pontos finais seguem todas as frases suicidas que procuram um fim. Sigo-te cega e estupidamente. Sigo-te consciente mas anestesiada pela luz da vela que, um dia, acendemos em segredo. Sigo-te na vã esperança que um golpe de sorte nos volte a cruzar os caminhos e faça reluzir os sonhos agora apagados.

Sigo-te pela estrada de sempre mas com passos tímidos e hesitantes. Sigo-te calada e atenta, ponderada e racional.

Sigo-te mas vou. Ligeira e livre, como o rio que desagua no mar e a ave que voa no céu. E vou. Vou de certeza. Vou nos teus passos que agora são meus. Vou nos braços que esperam abraços e nas juras que estão por selar.

Sigo-te mas vou. E levo comigo os mapas rotos e as ruas sem saída. Nos teus passos, vou. Vou devagar, porque a vida é uma viagem, não uma corrida.

Patrícia Silva – 19|07|2015

Prometi falhar.

Transformação

Cheguei a casa e, pela primeira vez, tirei os sapatos à porta. Tive de o fazer para que as tuas pegadas deixassem de fazer sombra aos meus pequenos passos errantes. Mas não chegou. Tirei toda a roupa que me cobria a pele suada e cansada. Virei e revirei a mala dos sonhos que, um dia, pintámos de verde esperança. Soltei o cabelo e limpei a maquilhagem. Mas não chegou.
Não chegou porque te tenho gravado na alma e na pele. Como um cunho firme em papel fino ou uma tábua cravejada de pregos. Não chegou porque este Inverno escuro e chuvoso teima em não me largar. Nem ele nem a tua presença ameaçadora e cortante.
Prometi falhar. Sempre prometi aquilo que podia cumprir. E falhei. É tão simples não é? Falhar. Falhei.
Uma mulher e a mesma mulher apaixonada não são a mesma pessoa. A primeira vai em frente, tem medo (muito medo) mas vai. Porque é ela e ela. Livre, assim, só ela. A segunda também vai… mas vai debaixo da asa da paixão. Vai iludida e inebriada pelo êxtase do desejo e da vontade. Vão as duas, mas uma chega mais longe. Pode não chegar primeiro, mas chega mais longe.
Qual delas sou? Não sei. Sei que a vida não é nada sem amor. Não é vida porque o amor é uma questão de sobrevivência. E sem ele, nada somos, nada valemos e nada nos resta.

Prometi falhar. E falhei.

Patrícia Silva – 13|07|2015

Destino, safado!

Destino

Temos o destino traçado. Acredito nisso porque, caso contrário, a vida perderia toda a graça. Nós, que nos achamos donos de tudo e de todos, não passamos de marionetas nas mãos de um sabichão com a mania que pode tudo. E pode. A verdade é que, por mais ilusões que tenhamos, nada está nas nossas mãos. Não controlamos absolutamente nada. Uma viagem, uma saída com amigos, aquele jantar combinado há séculos, uma ida ao zumba ou ao ginásio, o saldo da conta bancária, as horas que tencionamos dormir hoje… tudo. Todos os nossos banais planos podem ficar pelo caminho se o gajo que mexe os cordelinhos lá em cima assim o quiser.

O que fazer? Nada. Somos muitos mas não conseguimos vencê-lo. E ainda bem! Se tudo estivesse única e exclusivamente nas nossas mãos isto era uma salgalhada que ninguém se entendia, nem é bom pensar.

Mas o raio do destino é do caraças, às vezes dá vontade de mandá-lo para um sítio que eu cá sei. Não adianta. Tenho aprendido isso com o passar dos anos. Aceitar aquilo que a vida tem para nos dar é uma grande virtude. Uma virtude de poucos.

O comboio não parou mas decidi saltar. Virei as costas aos fantasmas que tanto me gritavam à alma e tiravam a calma. O safado do destino resolveu mexer os cordelinhos e abanar-me a vida.

E agora? Agora não sei. Acho que tenho umas contas a ajustar com esse sabichão.

Patrícia Silva – 09|07|2015

Alguma vez te perdeste no caminho?

Direções opostas
Alguma vez te perdeste no caminho? De certeza que sim. E ainda te lembras o que se sente?  Espero bem que sim. Espero que sim porque é assim que me sinto agora, e quero que me compreendas. Aliás, tens obrigação disso. E sabes porquê? Porque, desta vez, nos perdemos os dois…
Sinceramente, não me consigo lembrar quando é que tomámos rumos opostos, mas a verdade é que isso aconteceu. Ou será que nunca nos encontrámos realmente?
Passamos a vida a criar laços, a deixar raízes aqui e acolá. Mas esquecemo-nos, constantemente, que o “para sempre” só dura até um dia.
Não gosto de me afeiçoar às pessoas. Aliás, não gosto de me afeiçoar a nada: nem às pessoas, nem aos animais, nem às coisas, nem aos momentos, nem ao passado, nem ao presente, nem às expectativas no futuro. Mas a verdade é que esta é, talvez, a característica que melhor me define. Sou uma “agarrada” por natureza, uma eterna saudosista, uma romântica parva, uma perfeccionista extravagante e uma mulher insaciavelmente carente de afetos.
Sou tudo o que não queria ou devia ser. Não por serem más qualidades, porque não são. Mas  acabo sempre magoada e isso irrita-me profundamente.
Nisto somos tão diferentes. És terra a terra, eu ando pelas nuvens e não consigo aterrar. És assertivo e pouco te interessa o passado ou o futuro. Eu vivo de sonhos e recordações. Não gostas de pirosices, eu contínuo a acreditar em grandes amores que podem não durar para sempre, mas são intensos e verdadeiros.
Passamos a vida a traçar rumos diferentes e direções opostas. Será que te apercebes disso? Sei que para ti o tempo é sagrado. Mesmo assim, espero que pares, pelo menos um minuto, e me digas se, afinal, já nos perdemos ou se ainda nem sequer nos encontramos…

Patrícia Silva – 21 Fevereiro 2013

A estrada que me leva a casa

Home is where the heart is

Bati a porta. Fechei todas as janelas e cobri meticulosamente toda e qualquer frincha por onde pudesse correr o ar. Bati a porta. E saí. Chegou a hora. Saí de ti para caminhar em mim. Agora sou eu e eu, eu comigo, nada mais. À minha frente? A estrada… longa e sombria. Dentro de mim? Um turbilhão de emoções e pensamentos.

Bati a porta porque chegou a hora. Saí para respirar e, agora, só o ar me acompanha. O ar e esta mala carregada de mapas rotos e sonhos gigantes. Não penso nem procuro nada. Quero ir longe. Para me perder bem longe de mim e voltar a encontrar quem saberá quando, onde e como…

E depois? Depois não sei… Sei que quero ser eu, com a força que me incendeia a alma, a travar as minhas batalhas. Quero cair sete vezes e levantar-me oito. Quero encontrar mãos carentes, olhos sôfregos de palavras e braços com falta de abraços. Quero lutar e viver. Viver, nada mais.

Naquele dia, saí para respirar. Não sei até quando… nem sei há quanto tempo foi. Afinal, o tempo não conta quando se começa uma nova viagem. Escrevo as palavras em sinais esperando, um dia, encontrar a estrada que me leva a casa. Afinal, “a nossa casa é onde está o coração”.

Patrícia Silva 07|07|2015